segunda-feira, 12 de abril de 2010

Entusiasmo

Dizem que foi o concerto que acabou com os sixties. A 6 de Dezembro de 1969, meses depois de Woodstock, com os Rolling Stones como mentores e cabeças-de-cartaz. Um concerto gratuito, nos arredores de San Francisco para tentar recriar o espírito do festival dos "Três dias de Paz e Música". Falharam.

No início de Gimme Shelter (1970), de Albert e David Maysles e Charlotte Zwerin, ouvem-se os organizadores anunciar uma experiência sociológica. "Estão a estacionar no sítio errado. Mas deixem-nos estar", dizem. Pela primeira vez, o princípio seria: os espectadores decidem. Cinco dias antes ainda não tinham recinto e as previsões apontavam para perto de vinte mil espectadores.

Apareceram 300 mil e ainda ninguém, sequer, pensara em segurança. Nas 'barraquinhas', em vez de sandes vendiam-se os aditivos químicos. Para todos os gostos e feitios, dos bons e dos maus e até alguns naturais. Até aqui, nada de novo. E o cartaz até ajudava ao festival onde os Hells Angels tinham sido convocados para o papel de Seguranças.

Mas sem ninguém saber, o mood de Woodstock tinha mudado. O guitarrista dos Jefferson Airplane foi espancado, assim como o baterista dos Gratefull Dead e, salvo erro, o guitarrista que acompanhava o Santana. Entre o público e os Hells Angels, também não apareceu nenhuma empatia. Reza a lenda que a turminha hippie pontapeou umas das Harleys que os seguranças tinham estacionado em frente ao palco. Depois, chegaram os Rolling Stones.

Cada música teve o final antecipado, com Jagger e Richards a pedir para que os ânimos acalmassem e escolherem as mais calmas do reportório. Não sei se terá sido a primeira vez que uma multidão revelou mau feitio, mas é certo que naquela noite não faltaram sopapos entre a geração flower power.

Uns entusiasmados com o consumo de drogas. Outros com um, estranhamente, legal estatuto de autoridade. E à volta do palco, meia dúzia de estrelas com pouco treino entre enchentes e, sobretudo, muita vontade de contrariar a "autoridade". Ao som de Under my Thumb, a escaramuça atingiu o nível histórico. Quando um tal de Meredith Hunter, bem em frente ao palco, sacou a pistola, bem frente ao palco. A reacção do Hell Angel de serviço, apareceu na ponta de uma faca. A autópsia disse que o puto de 18 anos morreu com facadas na orelha, nas costas, marcas de pontapés em todo o corpo e uma grande dose de metanfetaminas. Diz a lenda que queria disparar sobre a banda.

Pelo que tenho visto nas madrugadas do Cais Sodré, não sei se hoje a resposta da Autoridade seria muito diferente. Mas naquele festival, nos arredores de cidade Harvey Milk, o espírito da Paz e do Amor morreu. Quatro nascimentos e quatro mortes, fazem o saldo da última noite da década. Brian Jones despedira-se em Junho e nos dois anos seguintes, Morrison, Joplin, Hendrix também foram e naturalmente, a música e o mood do Mundo mudou.

Terá sido do excesso de entusiasmo?






Enjoy

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